Nunca vi o senhor Juiz! Excelentíssimo Promotor, pedi audiência para conhecê-lo… Antigamente, esse povo importante ia pras reuniões da comunidade. Era bom! A gente via e ouvia o padre, o prefeito e eles, também, os homens da Lei.
Mas hoje é diferente! Os caras passam num concurso, são obrigados a ir trabalhar numa cidadezinha, lá nas quintas do diabo. Ora se vão! Tem que ir… O salário vai pra mais de 20 mil!
Mas já chegam com raiva de tudo. Ah, é difícil separar-se da mulher, que não quer nem saber de morar no interior. “Deus me livre! Tenho que cuidar da educação dos filhos… Vá lá, chega num dia, volta no outro…” É, dá tempo de se ouvir alguém da oposição e construir algum processo contra a Administração Municipal, ou melhor, o senhor prefeito. “Não quero nem saber quem é! Nem sua vida, nem muito menos sua história…”
Nossos municípios são pobres e desestruturados. Muitas vezes, erramos diante da escassez jurídica, contábil e institucional. O promotor sabe?
Nos bons tempos de outrora, lá estava o senhor Juiz ou o respeitável Promotor, nas reuniões, falando pros jovens, pros mais velhos também. A gente gostava de ouvir o saber da Lei dos direitos e deveres de cada um e de todos. Mas hoje, não é mais assim! Antes, era bom sentir que Juiz e Promotor iam até as ruas defender o que nós achávamos bom: a nossa segurança, a nossa paz. Tinha até Juiz que ia na casa conciliar marido e mulher, em processo de separação!
Mas os tempos mudaram. Antes, Juiz e Promotor eram o terror de bandidos, marginais, ladrões e criminosos. Hoje, já não se fala em promotor que promovia a lei, a harmonia e a conciliação; em nome da Lei, combatia a marginalidade. O Juiz processava, julgava e punia… Mas era uma figura admiravelmente respeitada por todos. Estabelecia-se uma reciprocidade de civilidade e respeito. Percebia-se em cada um deles a cultura do humanismo e a consideração por todos e por cada um. Hoje, prefeitos e ex-prefeitos, inclusive os honestos e corretos, tremem diante dos que se nos apresentam como fiéis escudeiros da aplicação rigorosa da lei. Em ritmo sumaríssimo! Quando menos se espera, estamos nos bancos dos réus. Defenda-se quem tem condições e caros advogados!
Em Janduis, prefeito entre l983 e 1988, conheci e me relacionei com juízes e promotores que iam pro meio da rua, junto comigo, para evitar a truculência policial, em alguns momentos da nossa história, ainda com cheiro da finada ditadura. Homens e mulheres de extraordinária cultura humanista! Hoje, amarga-me constatar que, na minha reeleição, nem os parabéns recebi da dupla promotora/juiz. Que culpa temos nós, se eles, de fora, são obrigados a trabalhar algumas horas em nossas pequenas e menosprezadas cidades?
Hoje, carrego comigo a sensação de ser um corrupto criminoso, um bandido perigoso a quem não se deve nem ouvir, nem ter o direito de se defender. Como é que meus pacientes vão entender o psiquiatra, como é que meus filhos e mulher vão me ter, como é que meus amigos assimilarão esta nova e cruel etapa da minha história, depois que Promotor e Juiz me processam me julgam e condenam sem falar comigo?
Resistente à ditadura militar, às vezes, perseguido pelas minhas idéias socialistas, nunca fui tratado como criminoso, nem bandido como hoje, em pleno Estado de Direito.
Por Salomão Gurgel Pinheiro, Psiquiatra e Prefeito Municipal de Janduis
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